Sol da meia noite
Era meia noite quando saímos de Hammerfest e o sol mantinha-se acima do horizonte envolto numa atmosfera dourada de raios de luz amarelo pálido que se escoam por entre as montanhas escarpadas que contornam os fiordes profundos da costa recortada do norte da Noruega.
O sol da meia-noite no Cabo Norte (Nordkapp), Noruega
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Fora do porto aguardava-nos o Santa Cristina que esperava fazer serviço para receber os planos copiados por mim do original para poder entrar em Hammerfest com segurança e depois passar as outras três cópias aos navios que as tinham pedido ao capitão do Lutador.
Num mar estanhado, caldeado pelos tons metálicos do sol da meia noite, navegamos para nordeste rumo ao cabo Norte onde o sol da meia noite me pareceu mais espectacular, cintilando em tonalidades de um dourado pálido e mortiço como que a pedir que o deitassem para repousar de tantos dias sem descanso. Estávamos em pleno mar de Barents, avistamos alguns navios soviéticos na faina da pesca e largamos a rede numa zona desconhecida com fundos de lama segundo indicação da carta náutica.
Nestas latitudes para além do Círculo Polar Ártico, no Verão o sol mantém-se 67 dias acima do horizonte sem haver pôr-do-sol. Para nós que não estamos habituados a esta claridade e necessitamos de descansar porque o trabalho é por quartos (turnos), a solução encontrada para provocar o escuro foi forrar com papel, plástico ou pano de cor escura as vigias do camarote.
Sol da meia-noite à saída de Hammerfest, na Noruega
Um dia quando pescávamos nesta zona do mar de Barents o imediato quando virou a rede saiu-lhe em sorte uma sacada monumental de “limões”, espécie da família das esponjas mas com uma particularidade, possui uns picos cortantes tipo lã de vidro e é de difícil despejo, ficando presas umas nas outras e cortando as malhas da rede e do saco com as tentativas de as despejar. Para além de se ter perdido um tempo imenso, cerca de três horas para despejar o saco, a rede ficou toda traçada, imprópria para utilização futura.
A antecipação ou iniciativa própria não constituiu nesta viagem o forte dos portugueses que andaram toda a viagem às sobras dos franceses, talvez porque desconheciam a zona e não arriscavam meter-se em aventuras que pudessem ser-lhes prejudiciais. Mais uma vez os franceses um a um desapareceram do mar de Barents e passados dois dias anunciavam boas capturas no Svalbard.
Após conferência entre os capitães, nova emposta para o Spitzbergen e mais uma vez chegamos atrasados. A pesca em zonas baixas é ingrata. O bacalhau pelas suas características hidro-morfológicas e ambientais é um peixe omnívoro e muito voraz que é atraído por outras espécies de peixes como o sandilho, o capelim, a lula e, nas zonas de baixa profundidade relativa para a espécie, corre grandes extensões em busca de engodo. Quando se tem a sorte de andar no encalço do fiel amigo consegue-se fazer óptima pesca.
In “ A Epopeia dos Bacalhaus”
Capelim
A pesca estava a rarear. Haviamos percorrido todos os pesqueiros do Atlântico Nordeste e nem sinal do tão famigerado gadiforme.