Quando jovens ansiamos que o tempo passe rápido. Recordo-me como queria que o Natal chegasse depressa. É em dezembro que faço anos, ficava um ano mais velho, mas, as prendas no sapatinho, a festa em família, deslumbravam-me e marcaram sem dúvida (e ainda marcam) a minha relação com o tempo.
À medida que os anos foram passando a dimensão temporal foi-se modificando consoante as circunstâncias.
Primeiro foram os estudos. Quando começava o ano escolar pensava que ainda faltava tanto tempo até ao final do ano; quando faltava um mês para os exames desejava que o tempo esticasse a fim de ter tempo de rever matérias que tinha descuidado no tempo próprio.
A ânsia de terminar o curso e começar a trabalhar para ganhar dinheiro e não depender dos pais, foi outra época que passou na minha vida.
Os objectivos sociais superam o tempo: casamento, nascimento do 1.º filho, do segundo…, surgem os compromissos com a educação deles, a procura da estabilidade financeira, sucessões de comprometimentos que levam o tempo a escassear.
A epidemia da nossa sociedade é a fome de tempo, cada vez temos menos tempo para deixarmos fluir o nosso Eu – o tempo metafísico – em que a verdade conquista o tempo.
Quando menos esperamos passou-se uma vida, vem a aposentação e, habituados a consumir o tempo (ou a sermos consumidos por ele) não sabemos o que fazer com ele e damos por nós a procurar formas de passar o tempo cada um à sua maneira e segundo a sua consciência temporal.
Tentamos enganar o tempo (ou nos enganarmos), com ócio ou com trabalho, na ilusão de ficarmos com a sensação que o tempo passa depressa, mas já não queremos que passe, vivemos com ansiedade quando devíamos viver em paz e com serenidade.
Vivemos uma vida a enganar o tempo, não permitindo que ele flua naturalmente, sem pressões nem medos que só nos criam tensões que o nosso organismo não aguenta (daí as doenças). É costume dizer-se que as mazelas surgem no fim da vida, é um facto, são fruto das tensões acumuladas que o organismo não conseguiu expurgar por que já lhe falta a força com que foi enganando o tempo.
Muitas vezes, quando o tempo está bom, vejo o senhor Joaquim Ribeiro, um anfitrião com 104 anos, (se fosse vivo o meu pai teria a mesma idade) que admiro e respeito, a caminhar no molhe da Praia Norte e penso: - este senhor não enganou o tempo, deixou que ele fluísse naturalmente, sem tensões nem medos que o afetassem. Se o meu pai não tentasse enganar o tempo devido às pressões, angústias e receios, motivados pelas contingências da vida, ainda hoje poderia estar vivo como o senhor Ribeiro.
Não adianta enganar o tempo – a Verdade é eterna.
Viana do Castelo, 2016-01-10
Manuel de Oliveira Martins
maolmar@gmail.com